domingo, 29 de junho de 2025

A arte de existir sem medo

 Existir é caminhar descalço sobre espelhos, 
Aceitar os estilhaços como parte do reflexo. 
Não é ausência de dor, 
É dança com o desconhecido. 
 
A arte de existir sem medo 
É como respirar debaixo d’água: 
No começo, estranha-se o oxigênio do invisível, 
Mas depois o peito aprende 
Que viver é confiar no que não se vê. 
 
Não temas tua sombra, 
Ela é apenas a luz dizendo teu nome ao contrário. 
Aceita tuas dobras, teus abismos, 
Teu riso fora de hora, 
Eles também são parte da sinfonia. 
 
Quem existe sem medo 
Aprendeu que não precisa caber em molduras. 
Fez-se quadro vivo, 
Em constante rasura, 
Uma arte que se renova ao ser incompleta. 
 
Ser é um verbo que se aprende devagar. 
Mas quando o medo cede lugar ao espanto, 
A existência floresce 
Como uma planta que, pela primeira vez, 
Entende o sol. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 28 de junho de 2025

O brilho desse sorriso

 Teu riso é luz que rompe a madrugada, 
Clarão sereno em céu de tempestade, 
É flor que nasce em meio à caminhada, 
Milagre em forma de simplicidade. 
 
Nos lábios teus, encanto faz morada, 
E o mundo esquece toda a sua idade. 
Ao ver-te assim, de face iluminada, 
Renovo em mim a fé na felicidade. 
 
Teu riso é som de brisa em campo em flor, 
É bálsamo a curar qualquer cansaço, 
É chama doce a reacender o amor. 
 
E quando ris, o tempo perde o compasso, 
Pois tudo em ti se enche de esplendor, 
E eu me imagino inteiro em teu abraço. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Sonhando com o infinito

O universo se estende como um livro sem fim, 
Cada estrela uma palavra, 
Cada galáxia, um capítulo não escrito. 
E nossa imaginação, 
A pena inquieta 
Que ousa sonhar o que ainda não foi lido. 
 
Na dança silenciosa dos astros, 
Há segredos que nem a luz alcança. 
Mas no escuro do pensamento humano, 
Brilham ideias 
Que viajam mais longe que qualquer cometa. 
 
Somos poeira de estrelas 
Sonhando com o infinito. 
Enquanto o cosmos se expande, 
Nossos sonhos o acompanham, 
Saltando buracos negros, 
Sussurrando para quasares, 
Recriando mundos em silêncio. 
 
A mente é um telescópio voltado para dentro. 
Quanto mais olhamos, 
Mais percebemos que o universo lá fora 
Reflete o infinito que carregamos por dentro. 
 
Se há fim nas galáxias, 
Ele não detém a alma que imagina. 
Porque onde a física silencia, 
A poesia continua. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 26 de junho de 2025

A meiguice do teu olhar

Teu olhar, doçura em forma de alvorada, 
Desperta o sol nas sombras do meu dia, 
Traz a leveza em brisa delicada 
E acalma em mim a dor que antes doía. 
 
Há um silêncio terno em tua pupila, 
Que diz mais que mil frases no ar suspensas, 
E o mundo, ao ver teu brilho que cintila, 
Se curva à luz de intenções tão imensas. 
 
É como se os anjos, em reverência, 
Derramassem nos olhos tua essência, 
E o tempo parasse só para te mirar. 
 
Oh, se soubesses quanto me fascina 
Essa ternura pura, cristalina, 
Que mora serena no teu doce olhar. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 25 de junho de 2025

Não é sobre entender

Não é sobre entender. 
É sobre respirar o que não tem nome, 
Tocar com os olhos fechados 
O que não cabe nas palavras. 
 
O mistério não quer ser decifrado, 
Ele quer ser sentido, 
Como o arrepio sem razão, 
Como a lágrima que cai sem dor. 
 
Entender constrói paredes, 
Mas sentir abre janelas 
Por onde o invisível entra 
Com o peso exato de um instante eterno. 
 
O desconhecido não se explica, 
Se aceita. 
Não se ilumina com respostas, 
Se acende com presença. 
 
É como dançar no escuro 
Sem saber os passos, 
Mas ainda assim dançar, 
Porque o coração sabe a música 
Que a mente jamais escutou. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 24 de junho de 2025

No teu aconchego

No instante em que te encontro, 
Meu peito desaprende a pressa. 
O mundo desacelera… 
E a alma, cansada de vagar, 
Se entrega ao teu aconchego 
Como quem encontra morada 
Depois de mil invernos. 
 
O suspiro que nasce de mim 
Não é apenas ar, 
É a lembrança de todas as vezes 
Que sonhei com o abraço que agora me envolve. 
É o eco suave de um coração 
Que enfim repousa 
No território da tua presença. 
 
Há um alívio antigo 
Que escorre pelos meus ombros 
Quando me aninho no teu abraço. 
É como se cada parte de mim, 
Desfiada pelo tempo, 
Fosse costurada de volta 
Pelo calor do teu silêncio. 
 
O corpo relaxa, 
Os olhos fecham, 
A alma sorri por dentro. 
No teu aconchego, 
Não sou mais pedaços soltos, 
Sou inteiro. 
E o suspiro que escapa 
É oração sem palavras. 
 
É no teu colo 
Que o meu cansaço desaprende a ser peso. 
Meu suspiro não é desistência, 
É entrega. 
É o som manso 
De quem encontrou refúgio 
Na curva exata do teu abraço. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Não me esqueço do teu olhar

Guardo em mim o instante exato 
Em que o teu olhar acendeu o mundo. 
Por mais que o tempo insista em apagar, 
Há luzes que a memória nunca permite escurecer. 
 
O brilho dos teus olhos 
É um farol nas noites em que me perco. 
Mesmo longe, mesmo em silêncio, 
Há estrelas que só nasceram para me lembrar você. 
 
Não me esqueço do teu olhar, 
Porque há promessas que moram na luz 
E ecoam em mim como se fossem 
As últimas alvoradas da minha esperança. 
 
O teu olhar ficou em mim 
Feito cicatriz de claridade. 
Uma memória que reluz 
Sempre que o coração escurece. 
 
Não há distância capaz de apagar 
O brilho que teus olhos deixaram em mim. 
Porque certas luzes, uma vez acesas, 
Se tornam eternas dentro da gente. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 22 de junho de 2025

Quem nos desafia a crescer

Andar ao lado de quem nos desafia a crescer é como caminhar por uma estrada onde o horizonte nunca se acomoda. 
São pessoas que não nos oferecem o conforto da estagnação, mas o fogo gentil das perguntas difíceis. 
Gente que nos obriga a olhar para dentro, a revisar nossas certezas, a desconstruir as pequenas muralhas que erguemos ao redor da alma. 
 
Elas não aplaudem nossos erros só para agradar, nem silenciam diante da nossa própria covardia. 
São como espelhos que devolvem a nossa imagem sem filtros… 
Como ventos que varrem a poeira dos nossos olhos, mostrando o que ainda não vemos, o que fingimos não sentir. 
 
Andar com quem nos desafia a crescer é abrir mão da zona segura… 
É aceitar os desconfortos que nos fazem sair da sombra e procurar a luz que nos habita, mesmo que escondida. 
É se permitir ser ferido pela verdade, para depois ser curado pelo amadurecimento. 
 
São pessoas que, ao invés de nos manter onde estamos, nos empurram para onde podemos ser.
Amigos que não nos deixam ser menos do que somos capazes de ser. 
Amores que nos amam não só pelo que somos, mas pelo que podemos nos tornar. 
 
Porque crescer, no fundo, é um ato de coragem… 
E caminhar ao lado de quem nos desafia é escolher, todos os dias, não desistir de si mesmo. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 21 de junho de 2025

O desejo que provocas em mim

 Há em ti um incêndio quieto, 
Uma chama que me toca mesmo de longe. 
Teu olhar acende em mim 
O que a razão tenta apagar, 
Mas o corpo insiste em lembrar. 
 
Te encontro em cada silêncio, 
Em cada ausência de ar. 
O desejo que provocas 
É essa dança invisível 
Entre a pele e o pensamento, 
Um eco de ti dentro de mim. 
 
Quando penso em ti, 
Meu corpo inventa caminhos 
Que a realidade não ousa traçar. 
Cada palavra tua é um convite, 
Cada gesto, uma promessa sussurrada. 
 
O desejo que provocas é um veneno doce, 
Uma febre que chega sem aviso, 
Queima na pele, invade o peito 
E me transforma em espera. 
 
Não sei se te desejo pela tua presença 
Ou pela ausência que deixas quando partes. 
O fato é que, entre o querer e o tocar, 
Há um abismo chamado saudade 
E nele, eu me lanço… todas as noites. 
 
Teus gestos são mapas 
E eu sou viagem. 
Tua voz é orvalho 
E eu sou a relva molhada. 
Teus olhos… 
Ah, teus olhos… 
São destino e perdição ao mesmo tempo. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Ídolos e ilusão

 Por que idolatrar um ídolo 
Se tu mesmo és a miragem 
Que desenha teus próprios desertos? 
 
Por que elevar um nome, 
Uma face, uma estátua de barro 
Se tua essência 
Já é feita de pó, vento e invenção? 
 
O que é um ídolo senão um espelho 
Onde projetas a ausência de ti? 
Um vulto que ocupa o espaço vazio 
Onde tua coragem deveria morar. 
 
Idolatrar é esquecer-se. 
É exilar-se da própria pele. 
É vestir máscaras sobre outras máscaras, 
Até que o rosto original desapareça 
Debaixo do peso das imagens. 
 
Tu és tua ilusão… 
E também o escultor que dá forma ao nada. 
O eco que grita 
Dentro da caverna que chamaste de alma. 
 
Nenhum altar te fará inteiro. 
Nenhum mito te libertará da verdade: 
És tu o sonho que sonha a si mesmo 
Enquanto procura de joelhos 
Um deus que nunca esteve fora. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Onde mora a verdade

 A verdade nunca se oferece de mãos limpas. 
Ela vem coberta de espinhos, 
De dúvidas, de espelhos partidos. 
Onde quer que ela habite, 
É preciso atravessar a pele do medo 
E tocar com os próprios dedos o que queima. 
 
A verdade mora nos cantos escuros da alma, 
Nos silêncios que evitamos, 
Nas perguntas que fingimos não ouvir. 
Para alcançá-la, 
É preciso despir-se das certezas, 
Abrir as mãos, 
E aceitar o peso e a beleza do que ela revela. 
 
Onde quer que se esconda a verdade, 
Ela lateja como uma ferida oculta. 
Quem a toca, sangra. 
Quem a ignora, adoece por dentro. 
A coragem é a chave 
Que gira na porta de todas as revelações. 
 
A verdade não é flor de jardim. 
É planta que cresce entre pedras, 
Sob o calor das escolhas difíceis. 
Para tocá-la, é preciso calos na alma 
E uma fé teimosa de que o real, 
Por mais duro que seja, 
Ainda vale mais que qualquer ilusão. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Não há caminho longe de você

 Não escolhi te amar. 
Foi o destino 
Me conduzindo pelos fios invisíveis 
Que costuram os encontros inevitáveis. 
A cada tentativa de fuga, 
Era o seu nome que o vento sussurrava de volta. 
 
Há coisas que nascem antes da vontade, 
Antes da razão, 
Antes mesmo de qualquer defesa. 
Você é uma dessas coisas. 
Uma raiz que brotou no meu peito 
Sem que eu pudesse impedir. 
 
Eu lutei. 
Neguei. 
Me escondi em silêncios profundos. 
Mas no fim, 
Era sempre o seu riso que iluminava as frestas 
Por onde minha resistência escapava. 
 
Não amar você seria como não respirar. 
Como pedir ao rio que pare de correr, 
Ao céu que abandone a cor azul, 
Ou ao tempo que volte atrás. 
Há destinos que se escrevem sozinhos. 
O meu… tem o seu nome. 
 
Entre todas as escolhas que tive, 
A única impossível foi não te escolher. 
Meu coração, teimoso e submisso, 
Sempre soube: 
Não há caminho longe de você. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 17 de junho de 2025

É o coração quem paga

No contrato invisível da vida, 
O coração assina sem ler as cláusulas. 
Ama por inteiro, 
Mora onde é mal recebido, 
Paga aluguel em lágrimas, 
E ainda deixa flores na porta de quem parte. 
 
Às vezes é mais cômodo ficar, 
Mais fácil ceder, 
Mais seguro calar. 
Mas o amor… 
O amor nunca faz as contas. 
É o coração quem paga, 
Com juros de saudade 
E multas de silêncio. 
 
Escolher a conveniência 
É dormir num quarto sem janelas, 
Com vista apenas para o que não sentimos. 
Mas o coração… 
Teimoso inquilino, 
Insiste em abrir frestas, 
E deixa o vento entrar 
Mesmo quando o aluguel é cobrado em dor. 
 
Há quem diga que amar é um luxo, 
Outros, que é necessidade básica. 
Mas, entre um e outro, 
Fica a certeza amarga: 
O coração nunca é isento 
De impostos emocionais. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

Sem o teu sorriso

 Sem o teu sorriso, 
As manhãs parecem incompletas, 
Como um poema interrompido antes do último verso, 
Como um céu que esqueceu de amanhecer. 
 
Fico aqui, 
Entre o café frio e as horas arrastadas, 
Tentando decifrar os caminhos que restaram, 
Mas tudo parece errar o passo 
Sem a bússola que era o teu riso. 
 
O mundo segue, 
Mas eu me perco nas esquinas dos dias, 
Procurando aquele brilho breve 
Que fazia até o silêncio parecer música. 
 
Sem teu sorriso, 
Não sei onde pousar os olhos, 
Nem em que direção guardar a esperança. 
É como esquecer o próprio nome 
No meio de uma frase. 
 
A vida continua, dizem… 
Mas cada passo é um tropeço, 
Cada respiração, um ensaio malfeito, 
Porque tudo em mim ainda te procura 
Nas frestas de luz que o teu sorriso deixou. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Quando me lembro de mim

Às vezes, no silêncio entre dois passos, 
Um pensamento antigo me alcança. 
Não vem como relâmpago, 
Vem como brisa que atravessa 
Janelas mal fechadas, 
Trazendo o cheiro da infância 
Ou o gosto de uma esperança esquecida. 
 
É nesses instantes que me lembro de mim. 
Não do nome, 
Não da profissão, 
Mas daquele que sonhava escondido no quintal 
Com mundos impossíveis, 
Com vozes que o mundo ainda não escutava. 
 
Há lembranças que não são imagens, 
São sensações: 
A vertigem antes da escolha, 
O calor do primeiro erro, 
O silêncio após a última palavra não dita. 
 
E então percebo: 
Sou feito desses fragmentos, 
Do menino que desejava voar, 
Do jovem que não temia o escuro, 
Do adulto que ainda procura abrigo em versos. 
 
Cada pensamento que volta 
É um espelho sem moldura, 
Onde enxergo não só o que fui, 
Mas o que continuo sendo, 
Mesmo quando esqueço. 
 
Porque no fundo, 
Somos memória viva, 
Feito páginas escritas a lápis, 
Onde o tempo tenta apagar, 
Mas o coração insiste em reler. 
 
E quando me lembro de mim, 
Não é passado que retorna, 
É a raiz que me sustenta, 
O fio invisível que me costura 
E me permite continuar sendo 
Mesmo entre tantas versões. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 15 de junho de 2025

Quando me isolo

 Às vezes me isolo. 
Não por raiva, nem por desprezo. 
Não é ausência, nem frieza… 
É só um jeito torto de me manter inteiro. 
 
Há um canto em mim onde só o meu silêncio cabe. 
Um lugar onde as palavras do mundo não entram, 
Onde os conselhos são ruídos e os abraços, 
Por mais sinceros, não alcançam. 
 
É lá que me sento no chão e converso 
Com os pedaços que deixei cair ao longo dos dias. 
Recolho o que sobrou de mim, 
Varro a poeira das mágoas, 
Desfaço os nós que ninguém viu. 
 
Quem me olha de fora pode pensar que é fuga. 
Mas não é. 
É cuidado. 
É sobrevivência. 
 
Há um idioma que só eu entendo. 
E é nele que me refaço. 
 
Então, me deixe viver 
Desse jeito meio recluso de vez em quando. 
Ou, se quiser mesmo estar comigo, 
Venha… 
Mas venha sem pressa, 
Sem cobranças, 
Sem querer abrir as portas 
Que ainda não estou pronto para destrancar. 
 
Viva comigo… 
Mesmo que, às vezes, 
Isso signifique me esperar em silêncio. 
 
Porque quando eu voltar, 
Voltarei inteiro. 
E aí, talvez, te conte o que aprendi comigo mesmo. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 14 de junho de 2025

O sentido corrompido

 Há um instante em que o coração se inclina, 
Não mais para o que é puro, 
Mas para o brilho falso 
Daquilo que o mundo chama de conquista. 
 
É quando o sentido se corrompe, 
Como um rio que, ao invés de seguir para o mar, 
Se perde em charcos de vaidade. 
 
Buscamos aplausos, 
Como se o eco de vozes alheias 
Pudesse preencher o vazio que cavamos dentro. 
E confundimos o reflexo com a essência, 
A imagem com o ser, 
O elogio com a verdade. 
 
A vaidade é um espelho sujo, 
Que deforma o que temos de mais humano. 
Faz-nos esquecer que a beleza real 
É feita de silêncios, 
De gestos pequenos, 
De quedas e reconstruções. 
 
Perseguimos uma perfeição ilusória, 
Ignorando que o que nos priva dela 
É justamente a ânsia de parecer perfeitos. 
Quanto mais corremos atrás da máscara, 
Mais nos afastamos do rosto. 
 
O orgulho grita, 
Mas a alma sussurra. 
E no fim, tudo o que sobra 
É um gosto amargo 
De ter amado mais a aparência 
Do que a vida em si. 
 
Quem dera entendêssemos cedo 
Que o valor de um passo verdadeiro 
Vale mais que mil caminhos encenados. 
Que a humildade é a ponte 
E a vaidade, o abismo. 
 
E que a perfeição, se existe, 
Mora apenas no instante 
Em que somos inteiros, 
Mesmo que imperfeitos. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Cada livro na estante

 Há um perfume antigo nas páginas que toco, 
Cheiro de tardes perdidas em silêncio, 
Onde o mundo parava só para me ouvir sonhar. 
 
Cada livro na estante 
É um espelho de mim em outra era: 
Um eu mais jovem, mais curioso, 
Ainda deslumbrado com a ideia 
De que letras podem ser portais. 
 
Sinto falta das noites em que uma vela bastava, 
E o coração batia ao ritmo das palavras. 
Ler era viajar sem deixar a coberta, 
Era amar sem saber o nome do autor. 
 
Os livros que li me ensinaram a lembrar 
Do que nunca vivi, 
Um tipo de saudade 
Que só os leitores entendem. 
 
Alguns livros ainda sussurram quando os abro, 
Como velhos amigos reencontrados, 
Com histórias que me conhecem melhor 
Do que eu mesmo. 
 
Às vezes, passo os dedos nas lombadas 
Como quem acaricia um relicário. 
Ali mora minha infância, 
Meus primeiros sonhos, 
Minhas primeiras fugas. 
 
O tempo passou, 
Mas a promessa ainda ecoa: 
Abra um livro 
E o mundo se dobra aos seus pés. 
Nada é mais eterno 
Que um instante lido com o coração. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Um tipo de silêncio

Há um tipo de silêncio 
Que não se encontra no fim dos sons, 
Mas no meio do tumulto 
Um refúgio invisível onde a alma sussurra 
O que nem o mundo ousa escutar. 
 
Enquanto os minutos se desdobram em pressa, 
Busco o instante imóvel entre dois suspiros 
Um abrigo onde o tempo hesita 
E a inquietude se curva diante do vazio. 
 
No caos das vozes e passos apressados, 
Há um silêncio escondido, 
Como um animal tímido entre folhas secas, 
À espera de quem o saiba encontrar. 
 
A inquietude é uma prece sem resposta. 
Mas quem aprende a escutá-la 
Descobre que o silêncio não é ausência, 
É presença profunda demais para palavras. 
 
Busco o silêncio como quem busca o céu 
Num quarto sem janelas. 
Ele está dentro, não fora. 
Não se conquista — se aceita. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 11 de junho de 2025

A ausência revela

A ausência não é o contrário da presença. 
É o que sobra dela. 
Como a marca do corpo no barro, 
Como o eco depois do grito. 
 
Tudo o que amamos, 
Cedo ou tarde, se ausenta, 
E somos forçados a aprender 
A linguagem do que falta. 
 
O tempo, esse escultor invisível, 
Não molda o que vemos, 
Mas o que perdemos. 
Somos feitos tanto de presenças 
Quanto de lacunas. 
 
A ausência revela. 
Mostra o que era essencial 
Sob o véu do hábito. 
Mostra que o outro, 
Mesmo partindo, 
Permanece como espelho 
Do que somos quando amamos. 
 
Sofrer a ausência 
É uma forma de lembrar 
Que já estivemos completos, 
Ou acreditamos estar. 
É a memória recusando-se 
A aceitar a dissolução. 
 
E ainda assim, 
Há algo belo nisso: 
O vazio nos ensina 
A ver com olhos internos, 
A ouvir com o que sobra do silêncio, 
A tocar com o pensamento. 
 
Talvez, no fim, 
Tudo seja ausência. 
O mundo, 
A vida, 
O próprio eu, 
Um intervalo entre dois desconhecidos. 
 
Mas há nobreza 
Em quem sofre a ausência 
Sem perder o gesto de acolher, 
Sem apagar o lume da espera, 
Sem deixar de chamar, 
Mesmo que ninguém responda. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 10 de junho de 2025

Antes do começo

Por que você trava 
Antes do começo, 
Com as mãos cheias de ideias 
E os pés presos no avesso? 
 
É o medo quem sussurra: 
“E se não for suficiente?” 
Ou o eco do perfeccionismo, 
Exigindo o impossível, urgente? 
 
Você sonha alto, 
Mas o chão parece fundo, 
E cada passo adiado 
É um abismo em segundo. 
 
A mente corre à frente, 
Prevê falhas, tropeços, 
E esquece que a beleza 
Nasce dos começos imperfeitos. 
 
Não é falta de força, 
É excesso de cuidado. 
Mas coragem, às vezes, 
É só um erro bem lançado. 
 
Permita-se o rascunho, 
O traço torto, a palavra errada. 
Pois travar é do humano, 
Mas criar… 
É atravessar a estrada. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 9 de junho de 2025

O silêncio nas engrenagens

Há um silêncio que range 
Entre os dentes das engrenagens, 
Como se a vida mastigasse devagar os instantes. 
Não é ausência de som, 
Mas uma pausa suspensa 
Entre um suspiro e outro do mundo. 
 
Enquanto a máquina da existência hesita, 
O silêncio mora nos intervalos, 
Feito semente no asfalto, 
Sonhando com raízes 
Que rompem a precisão do ferro. 
 
O barulho do mundo é constante, 
Mas é no quase ruído que nos revelamos, 
Somos mais do que movimento: 
Somos espera, falha, vertigem. 
 
Entre o tic e o tac, 
Há uma eternidade calada. 
Ali, o coração se pergunta: 
Isso é vida, ou apenas o hábito de continuar? 
 
O silêncio nas engrenagens 
Não é defeito, 
É memória, é escuta, 
É a alma da máquina que por um instante 
Lembra que também já foi humana. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

É preciso andar devagar em Cáceres

Cáceres desperta devagar, 
Como quem sonha ainda de olhos abertos. 
Suas ruas são murmúrios do tempo, 
E o rio Paraguai — espelho antigo, 
Carrega segredos em suas águas largas. 
 
Na beira do majestoso Rio Paraguai, 
A cidade respira um calor de infância, 
Com alguns quintais, ainda, 
Cheios de cajus e silêncios, 
Onde o vento conta histórias 
De barcos, de santos e de assombrações. 
 
Cáceres tem um jeito de olhar para gente 
Como quem já sabe o que escondemos. 
Entre igrejas de pedra e árvores centenárias, 
Ela escuta — paciente, 
O que nem dizemos em voz alta. 
 
Ali, o pôr do sol é uma cerimônia. 
Pintura viva sobre águas calmas, 
Onde garças pousam como se fossem canções. 
A cidade toda vira oração, 
Feito um salmo entoado em silêncio. 
 
É preciso andar devagar em Cáceres, 
Pois o tempo se dobra em suas esquinas. 
E quem corre, perde a chance 
De ouvir o canto dos tuiuius, 
O deslizar suave dos jacarés 
Ou ver o rio sorrindo à lua. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense