quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Carrego teu nome em pensamento

 Há um nó no peito que não se desata, 
Feito laço de silêncio e desejo. 
Amo com a alma escancarada, 
Mas meus lábios são cárceres do segredo. 
 
Vejo teu riso e sou sombra atrás da luz. 
Tua felicidade é meu veneno e minha cura. 
Porque te amo tanto, não te toco. 
Porque te respeito, me desfaço em silêncio. 
 
Carrego teu nome em pensamento, 
Como quem guarda fogo entre as costelas. 
Não posso acender, não posso apagar. 
Apenas arder, inteiro e invisível. 
 
Tu amas outro, 
E eu amo em mim tudo que jamais serei contigo. 
Sou testemunha da tua alegria, 
E cúmplice do meu próprio naufrágio. 
 
Quem me dera amar menos, ou te esquecer. 
Mas o amor verdadeiro não pede permissão, 
Nem se esconde: 
Ele apenas aprende a dançar no escuro. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

A História como respiração do mundo

 A História não é apenas um acúmulo de datas — é a pulsação mais antiga do mundo. 
É o sopro que antecede cada gesto humano, o silêncio que sussurra por trás das cidades, das ruínas, das catedrais, das encruzilhadas poeirentas onde homens e mulheres decidiram, um dia, quem poderiam ser. 
 
Estudar a História é ouvir o coração do tempo. 
E o tempo, quando ouvido com atenção, revela seus movimentos secretos. 
 
A História nos ensina que nada nasce sozinho: as ideias têm ancestralidade, os sonhos têm raízes, e até o caos obedece a um desenho invisível. 
Cada época carrega sua dor, sua fome de sentido, sua obsessão e sua coragem — como se o mundo fosse feito de sucessivas tentativas de compreender a si mesmo. 
 
Conhecer o passado é um ato de ternura. 
Porque é reconhecer que outros caminharam antes de nós, erraram antes de nós, amaram e lutaram antes de nós. 
E que, mesmo assim, ousaram continuar. 
 
A História é o espelho onde o presente encontra seu próprio rosto. 
E às vezes esse rosto assusta — outras vezes inspira. 
Mas ignorá-lo é caminhar às cegas. 
 
Aprender História é o mais humano dos gestos: é juntar fragmentos de vidas alheias e reconstruir, com cuidado, a tapeçaria do que fomos para entender aquilo que poderemos ser. 
É um exercício permanente de empatia. 
É um pacto com a lucidez. 
 
O conhecimento histórico nos liberta do engano confortável de pensar que somos únicos, ou inéditos, ou donos absolutos de nossas próprias ideias. 
Ele nos lembra que fazemos parte de uma corrente profunda, antiga, interminável. 
Uma corrente que começou antes de qualquer registro e continuará muito depois que nossos nomes virarem pó. 
 
A História é o que impede os homens de repetirem seus pesadelos. 
É também o que permite repetir seus melhores sonhos. 
 
Ela nos convoca a pensar com a serenidade de quem conhece o caminho — e a agir com a responsabilidade de quem sabe que cada escolha se tornará, inevitavelmente, memória de alguém. 
 
Defender a História é defender a consciência. 
É defender a capacidade de aprender, de reparar, de refazer. 
É recusar a amnésia coletiva, esse sono perigoso em que sociedades inteiras esquecem como chegaram até aqui. 
 
Por isso, quem estuda História não vive no passado. 
Vive em todas as épocas ao mesmo tempo. 
E por isso enxerga mais longe. 
 
Porque a História, afinal, não é o que passou. 
É o que permanece. 
 
É aquilo em nós que nunca termina. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

O desejo que não posso sentir

 Amo teus olhos que nunca vi, 
Como quem se apaixona por um eclipse antes de acontecer. 
Eles vivem em um reino entre sonho e ausência, 
E ainda assim iluminam mais do que a luz que alcanço. 
É estranho amar o que não se viu, 
Mas talvez o amor seja sempre isso: 
Um tato cego, procurando calor no escuro. 
 
Teu olhar inexistente pesa em mim 
Como se já tivesse me atravessado um dia. 
Invento cores que talvez não existam, 
Formas que talvez te neguem, 
Mas é no impossível que meu peito se aquece. 
Talvez teu rosto more apenas na fronteira 
Entre o que lembro e o que desejo. 
Mas é lá que também moro eu. 
 
O desejo que não posso sentir 
Arde como uma chama que insiste em não tocar a pele. 
É um fogo de vento, 
Invisível, indomável, silencioso. 
E mesmo assim me queima. 
Há vontades que não pedem corpo, 
Apenas espaço dentro de nós. 
 
Amo-te no vazio, 
Onde teus olhos deviam estar. 
Talvez por isso o amor seja tão vasto, 
Porque cresce onde nada existe. 
E o que não posso ver em ti 
Se torna exatamente aquilo que mais procuro ver em mim. 
 
Entre nós há uma distância que não se mede, 
Um abismo que não impede, 
Uma falta que floresce. 
E é nessa ausência viva 
Que te encontro de forma mais inteira: 
Um desejo que não posso tocar, 
Um par de olhos que brilham 
Exatamente porque nunca me olharam. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

Digo que é o vento

 Às vezes a noite é tão grande 
 Que parece caber dentro de mim. 
E no escuro do meu peito, 
O teu nome brilha como janela acesa 
Em casa abandonada, 
Uma luz que não devolve ninguém, 
Mas insiste em ficar acesa. 
 
As horas vazias são mares sem lua. 
Eu navego nelas com as mãos frias 
E o coração tateando sombras, 
Procurando o teu rastro 
Como quem busca água 
Num deserto que já sabe o fim. 
 
Penso em você como quem segura um objeto frágil: 
Com cuidado, com medo, com vício. 
E cada lembrança tua 
É uma porta abrindo sozinha no corredor, 
Lembrando-me que a casa é minha, 
Mas o silêncio é teu. 
 
Há noites em que o mundo inteiro dorme, 
Menos a saudade. 
Ela vigia, ela respira, ela caminha pelos cantos, 
Sussurrando teu nome 
Como se fosse um feitiço 
Que me mantém acordado. 
 
Se alguém me perguntar por que não durmo, 
Digo que é o vento. 
Mas é mentira. 
É você soprando dentro de tudo que me falta. 
 
A verdade é simples e cruel: 
As noites são vazias, 
Mas eu não. 
Eu transbordo, 
De você, do que não foi dito, 
Do que ainda queima nas entrelinhas. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 30 de novembro de 2025

Incompreensões

 Há uma violência silenciosa em estar perdido: 
Não é o grito, mas o eco. 
O mundo continua, 
E você permanece ali, 
Um vulto colado à própria sombra, 
Tentando decifrar mapas que nunca foram desenhados 
Para o seu tipo de alma. 
 
Os dias se enchem de incompreensões 
Como quartos mal arejados. 
Entramos neles, respiramos o que não entendemos, 
E saímos com um peso que não sabemos nomear. 
A vida segue, 
Mas algo em nós fica para trás, 
Um pedaço que tenta ainda traduzir o indizível. 
 
Perder-se é descobrir que o tempo 
Não é linear, 
Mas um labirinto em chamas. 
Cada passo é uma ferida, 
Cada escolha um corte, 
E, mesmo assim, caminhamos, 
Como quem espera que no centro do fogo 
Haja finalmente um sentido. 
 
As incompreensões doem 
Porque nos tornam estrangeiros de nós mesmos. 
É brutal perceber que ninguém enxerga 
O que carregamos na pele por dentro. 
Ainda assim, seguimos, 
Como rios que não escolhem suas margens. 
 
Há dias em que a alma tropeça. 
E a violência não está na queda, 
Mas no chão que se afasta toda vez 
Que pensamos tê-lo alcançado. 
Nesses dias, tudo é enigma, 
E nós — frágeis decifradores, 
Tentamos sobreviver às próprias perguntas. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 29 de novembro de 2025

De um outro eu

 Ontem foi um mau sonho que alguém teve por mim. 
E eu acordei dentro dele. 
 
As horas se arrastavam como sombras indecisas, 
E o ar parecia feito de lembranças que não me pertenciam. 
Havia vozes chamando por um nome que não era o meu, 
Mas que eu reconhecia como se viesse de um outro tempo, 
De um outro eu, esquecido entre duas realidades. 
 
Talvez eu seja apenas o resquício do sonhador, 
O reflexo de uma consciência cansada 
Que tentou acordar e falhou. 
Porque o sonho continuou… 
E eu segui nele, vestindo a carne de quem dorme. 
 
Senti o toque frio de algo que não existe, 
Vi rostos desfeitos pela própria dúvida, 
E compreendi: o pesadelo não pertence a ninguém, 
Ele apenas escolhe moradas temporárias. 
 
Ontem, ele habitou em mim. 
Hoje, talvez em você. 
E amanhã… quem sabe o mundo inteiro 
Não passe a sonhar o mesmo sonho escuro? 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 23 de novembro de 2025

Liberdade em chamas

Dizem que a liberdade é um pássaro, 
Mas às vezes ela vem como bomba, 
Como fogo que consome a casa inteira 
Só para apagar uma tranca na porta. 
 
Às vezes ela veste farda, 
Grita ordens entre corpos caídos, 
E em seu nome, sangue escorre 
Como se a paz nascesse do abismo. 
 
Outras vezes, ela sussurra 
Nos corredores da mente partida, 
Dança descalça sobre os cacos da razão, 
E ri, enquanto o mundo chama de loucura 
O simples ato de ser inteiro. 
 
Talvez a guerra e a loucura 
Não sejam caminhos para a liberdade, 
Mas espelhos estilhaçados do desejo 
De viver sem correntes, 
De sentir sem algemas, 
De ser sem permissão. 
 
E quem caminha por esses extremos 
Não busca a glória, 
Mas a chave. 
 
Mesmo que ela esteja 
No fundo de um sonho febril 
Ou no último sopro 
De um campo em chamas. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

E então digo adeus

 No silêncio onde o amor costuma se esconder, 
Eu descobri o nome de outra pessoa 
Batendo dentro do teu peito. 
Não houve grito, nem tempestade — apenas a verdade 
Descendo lenta, 
Como uma lágrima que sabe exatamente 
Onde vai cair. 
 
É estranho, quase sagrado, ver o fim se erguer 
Com a delicadeza de uma despedida 
Que não pede permissão. 
Percebo que teu coração já caminha em outra direção, 
E eu fico aqui, parado na fronteira 
Entre o que fomos e o que nunca mais será. 
 
O último adeus tem gosto de porta entreaberta: 
Não se fecha de repente, 
Apenas deixa de ser passagem. 
E enquanto te vejo partir, sinto algo curioso, 
Como se meu próprio peito aprendesse, 
A duras penas, que amar também é soltar. 
 
Levo comigo o que ficou intacto: 
O brilho de um instante, 
O calor de uma promessa antiga, 
O breve consolo de saber que, mesmo sendo o fim, 
A história passou por mim. 
 
E então digo adeus. 
Não o adeus de quem espera retorno, 
Mas o adeus de quem finalmente entende 
Que certos caminhos se despedem antes mesmo 
Que percebermos que estamos caminhando sozinhos. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

Transformações no mundo

 O mundo não errou — apenas se moveu. 
As ruas antigas, que um dia guardaram passos lentos, 
Agora tremem sob a pressa de relógios que ninguém controla. 
Não culpamos o passado por ter sido brando: 
Ele apenas dormia enquanto o futuro afiava suas lâminas. 
 
As transformações não pediram licença. 
Chegaram como vento que troca de direção no meio da noite, 
Fazendo as janelas rangerem, 
Fazendo o coração sentir 
Que algo não pertence mais ao lugar onde sempre esteve. 
 
Ainda assim, o antigo permanece, silencioso, 
Como um velho guardião que observa sem julgar, 
Sabendo que cada época acende suas próprias sombras. 
O contemporâneo apenas revela outras formas de escuridão, 
Outras máquinas, outros medos, 
Outros abismos que aprendemos a chamar de progresso. 
 
E nós seguimos — não como testemunhas culpadas, 
Mas como viajantes 
Que atravessam pontes que não construíram, 
Levando dentro do peito a memória do que fomos 
E a dúvida tremulante do que ainda podemos ser. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Amar não precisa doer

Te amei sem saber me guardar, 
Sem freio, sem rede, sem chão. 
Te dei o que havia para dar, 
Sem nunca escutar o "não". 
 
Te amei no escuro, inocente, 
Com sede de sol e calor. 
Te amei como ama quem sente, 
Sem peso, sem filtro, com dor. 
 
Não via limites, fronteiras, 
Confundi carinho e prisão. 
Achei que cair nas barreiras 
Era parte da devoção. 
 
Te amei sem saber que o limite 
Protege, resguarda o coração. 
Fui rio, fui mar, fui convite, 
Mas nunca fugi da razão. 
 
Agora, que sei me dizer, 
Me vejo e me entendo melhor. 
Amar não precisa doer, 
Nem nasce de um “sim” sem valor. 
 
Te amei, e não me arrependo, 
Mas hoje, com alma e razão, 
Prefiro um amor que, aprendendo, 
Também saiba ser um "não". 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 18 de novembro de 2025

Prisioneiros socioculturais

 Somos moldes de barro seco, 
Que nunca tocaram a água do próprio desejo. 
Vestimos máscaras herdadas, 
Chamamos de “eu” o que é apenas espelho. 
 
Na cela invisível da rotina, 
O grito não ecoa — vira bocejo. 
Chamam de “vida adulta” 
O enterro lento do que era selvagem. 
 
A liberdade sorri do outro lado da vitrine, 
Enquanto nos vendem padrões em liquidação. 
E o medo do estranho 
Vira corrente de ouro. 
 
Crescemos em jardins murados, 
Ensinaram-nos a chamar os muros de proteção. 
Mas quem nunca viu o mar 
Não sabe o que é o infinito. 
 
É preciso desaprender as certezas, 
Para descobrir as janelas na parede. 
A alma não nasceu para caber, 
Nas gavetas da tradição. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 17 de novembro de 2025

A casa do pensamento

Há uma casa invisível dentro de cada mente. 
Suas paredes são feitas de horas, 
E o teto, de silêncio. 
Ali, a disciplina é quem varre o chão das distrações, 
Mantendo o espaço limpo 
Para que as ideias possam respirar. 
 
O pensamento chega como quem bate à porta, 
Às vezes tímido, às vezes urgente. 
Mas só entra quando o espírito está em ordem, 
Quando a casa interior 
Foi varrida do ruído e do cansaço. 
 
Trabalhar o intelecto é um ofício paciente, 
Feito de gestos repetidos, 
Como quem aprende a escutar o som da própria escrita. 
A mente se torna espelho, 
E o espelho, janela. 
O mundo então se reflete, 
Não como é, 
Mas como pode ser pensado. 
 
A disciplina é o arquiteto invisível dessa morada. 
Ela ergue colunas de constância, 
Abre janelas de lucidez, 
E ensina que pensar 
É uma forma de fé, 
Fé na luz que vem 
De dentro para fora. 
 
Pois aquele que habita sua mente 
Com serenidade e rigor 
Descobre, um dia, 
Que o pensamento não é prisão nem dever, 
Mas um lugar onde o infinito 
Se senta à mesa 
E conversa. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 16 de novembro de 2025

Canto o meu próprio ser

 Eu canto o meu próprio ser 
Como quem afia uma lâmina na própria sombra. 
Cada verso nasce de uma pequena ferida, 
E ainda assim é música, 
A música daquilo que resiste. 
 
Canto porque sou feito de retornos, 
De ecos que ninguém ouviu, 
De tempestades que aprendi a domesticar 
Com as mãos nuas. 
 
E a vida plena de paixão 
Não é um jardim, mas um incêndio lento: 
Uma chama que não pergunta se dói, 
Que apenas cresce, consome, transforma. 
 
Há uma loucura doce 
Em existir com o peito aberto, 
Em permitir que o mundo me atravesse 
Como flecha, como sopro, como rito. 
 
Eu canto o meu próprio ser 
Para lembrar que ainda estou aqui, 
Mesmo quando me perco de mim. 
Canto porque as cicatrizes também têm voz 
E, às vezes, cantam mais alto que a pele. 
 
E se a vida é paixão, 
Que seja excessiva, faminta, inevitável. 
Que eu me reconheça no vermelho das minhas recusas, 
No brilho dos meus abismos, 
No tremor que anuncia que algo em mim renasce. 
 
Eu canto, 
Porque é a única forma de continuar vivo 
Dentro do que me devora. 
 
E, no fim, 
Sou eu que devoro a escuridão 
Para transformá-la em uma canção. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 15 de novembro de 2025

Mesmo que as crenças morram

 Há quem diga que a perdição é o fim. 
Mas às vezes ela é só o início de um silêncio 
Tão profundo 
Que nele podemos finalmente ouvir 
A nossa própria respiração: 
Um testemunho frágil 
De que ainda estamos aqui. 
 
E encontrar fé na extinção das crenças 
É como recolher brasas de um incêndio extinto. 
Não é a chama que retorna, 
Mas o calor que sobrou, 
Aquele calor teimoso, quase invisível, 
Que nos lembra que algo já ardeu em nós 
E pode arder de novo. 
 
Porque a fé, quando resta sozinha, 
Sem nome, sem rito, sem moradia, 
Vira apenas um impulso de continuar: 
Um movimento mínimo 
Que o mundo não percebe, 
Mas que mantém o peito aberto 
Ao que ainda pode nascer 
Do meio do nada. 
 
Existir assim — achar-se na perda, 
É como ser um farol esquecido numa costa morta, 
Que ainda insiste em girar sua luz 
Mesmo quando não há mais navios, 
Nem mar, 
Nem olhos atentos ao brilho. 
 
Talvez existir seja isso: 
Ser achado justamente onde nos perdemos, 
Carregar uma centelha 
Quando todo o resto virou cinza, 
E caminhar sabendo que, 
Mesmo que as crenças morram, 
O desejo de sentido não morre nunca. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

Sala sem portas

 Às vezes acho que estou preso 
Dentro de um espelho rachado. 
Cada pedaço tenta refletir um pedaço de mim, 
Mas nenhum diz a verdade inteira. 
 
Há dias em que sinto 
Que um nome quase nasce na minha garganta, 
Um nome para essa inquietação que me cerca, 
Mas ele morre antes do som. 
 
É como viver dentro de uma sala sem portas, 
Onde o ar não sufoca, mas também não liberta. 
Onde cada sensação é um fio solto, 
E quando tento pegar, 
Ele escapa entre os dedos. 
 
Eu me movo, mas não avanço. 
Eu penso, mas não defino. 
Eu sinto, mas não sei dizer o quê. 
 
Talvez eu seja uma frase que ainda não sabe 
Qual verbo pertence a ela. 
Ou talvez eu seja apenas o silêncio 
Entre duas palavras 
Importantes demais para serem ditas. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense