Escorrendo entre os dedos do agora,
Sempre aqui, nunca aqui,
Como a brisa que vem e se vai,
Tocando a pele, mas não o corpo.
O ontem é uma sombra que não é,
Um reflexo que se desfaz
Quando tentamos tocá-lo,
Um quadro pintado no vazio
Que se apaga assim que a cor se toca.
A criação, então, é um grito
No vazio da memória,
Uma tentativa de agarrar o que já foi,
Uma febre que busca curar
O que nunca foi doente,
Tornando visível o invisível,
Tornando eterno o que já morreu.
Mas a paranoia é o medo disfarçado,
O medo de que o ontem,
Embora fugidio, já mora dentro de nós,
Nos devorando sem que saibamos,
Como um segredo guardado
Na dobra do tempo,
Um eco que grita em silêncio
Quando calamos nossas vozes.
Criamos para escapar,
Mas talvez sejamos criados por isso,
Presas de nossa própria busca
Por aquilo que nunca podemos ter,
Presos ao ontem que nunca foi,
Vivos no hoje que não existe.
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

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