domingo, 10 de dezembro de 2017

Os últimos Dias de Cáceres


By Odair José

Damião levantou-se antes do dia clarear. Enquanto colocava a água no fogo para preparar o café foi até o quarto das crianças e as cobriu. Tinha um casal de filhos que mantinha com muita dificuldade. A vida não tinha sido muito generosa com ele. Olhou a esposa que ainda dormia. Preparou o café e tomou um gole. O único pedaço de pão que estava no forno do fogão velho ia deixar para os filhos. Enquanto arrumava a tralha de pesca pensava nas dificuldades em que estava atravessando aqueles dias.

Era um homem simples. Aos trinta anos ainda não tivera muita oportunidade de estudar e sabia ler bem pouco e esse pouco ele agradecia ao pastor de uma igreja que o havia ensinado através da leitura da bíblia.

Vivia com a mulher e as duas crianças em uma casinha de madeira bem humilde construída a pouco tempo, por meio de mutirão, no bairro Empa. Ainda não tinha luz e a proteção das crianças contra os mosquitos naquele lugar era um mosqueteiro que havia ganhado de um membro da igreja. Havia ido algumas vezes na igreja mais ainda não havia se convertido. Desde que havia sido demitido do frigorífico onde trabalhou por quase seis anos estava desempregado. Depois que acabou o seguro desemprego a sua única fonte de renda era carpir lote na cidade, coisa que não dava muito dinheiro. 

Nos últimos dias, no entanto, uma outra atividade o havia seduzido. A pesca. Como morava próximo do Rio Paraguai, emprestou uma canoa de um amigo e saia todo dia cedo para pescar só voltando à tarde com os peixes. Durante algumas semanas ele pescava de segunda a quinta-feira e saia para vendê-los na sexta e sábado. Deixava os peixes na venda do Seu Baiano para ser guardado em um freezer e vendido caso alguém aparecesse para comprar.

Naquela sexta-feira, porém, ele resolveu ir pescar e deixar para vender os peixes só no sábado. A semana não tinha sido boa para pesca. Mas, naquele dia, teve o pressentimento que o rio estava para peixes. Antes de sair de casa olhou outra vez para os dois filhos e, por um instante, os observou dormindo o sono dos anjos. Quando o dia clareou, ele já estava remando rio abaixo. Tinha descoberto um lugar onde era bom para pegar peixes. Estava na esperança de pegar um grande Pintado naquela oportunidade.

Com paciência ele fisgou vários peixes durante o dia. De vez enquanto ele beliscava a matula que tinha levado para comer. Sabia que devia esperar porque alguma coisa dizia que ia pegar um grande peixe. Enquanto o dia passava e ele permanecia de olho nas linhas lançadas no rio, Damião observava a paisagem à margem do rio, pensava na família, na vida.

O sol já se declinava no horizonte e ele resolveu ir embora. Chega por hoje, pensou. Foi justamente nesse momento que ele notou a linha. A fisgada foi violenta. O peixe puxava com força. Era dos grandes. Enorme mesmo. Debatia-se enquanto Damião sorria e gritava:

- Ah, ah, você é meu. Eu sabia!

Durante alguns minutos ele lutou com o peixe que fazia um barulho enorme na água. Estava próximo de puxar o peixe para dentro da canoa quando ouviu o grande estrondo. O coração quase parou, suas mãos ficaram trêmulas e soltou o peixe ao ver a fumaceira se levantando sobre a cidade.

- Meu Deus!!! O que é isso?!?

Continua... 

Texto: Odair José, O Poeta Cacerense

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