segunda-feira, 14 de abril de 2025

A lembrança dela

No entardecer, 
A lembrança dela é uma ausência 
Que se acende devagar, 
Como as luzes da cidade, tímidas, 
Sabendo que a noite vai chegar. 
 
Ela aparece no intervalo 
Entre o sol e o escuro, 
No momento exato 
Em que o dia parece cansado demais pra continuar. 
É quando o céu se desfaz em tons frios, 
E o silêncio pesa mais que o próprio tempo. 
 
Penso nela 
Como quem toca um retrato antigo, 
Sabendo que não há retorno, 
Só vestígios. 
 
O vento carrega o nome dela sem voz, 
E cada cor que desaparece do céu 
Me lembra o jeito 
Como ela foi sumindo de mim: 
Devagar, mas para sempre. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 13 de abril de 2025

Nas ruas de terra batida

 Na cidade pequena, 
Onde o tempo parecia escorrer devagar 
Como melado no pão, 
A infância era uma festa sem convites 
Bastava abrir o portão. 
Brincávamos descalços, 
Pés sujos e corações limpos, 
Os risos ecoando entre muros baixos 
E janelas sempre abertas. 
 
Tinha bola de meia, 
Tinha pique esconde até a lua subir, 
E um céu tão estrelado 
Que dava vontade de dormir olhando pra cima. 
A rua era nossa
Chão de aventuras, palco de invenções, 
E cada esquina, 
Um universo com regras só nossas. 
 
A felicidade morava ali, sem fazer alarde: 
No cheiro do pão da padaria, 
No som da bicicleta que rangia, 
No quintal com goiabeiras, 
No abraço da avó com cheiro de café. 
 
Éramos reis e rainhas 
De castelos feitos de barro, 
Corajosos diante de monstros 
Que só existiam na imaginação. 
E, mesmo sem saber, éramos completos 
Porque tudo cabia ali: 
O mundo, os sonhos e o agora. 
 
Hoje, tudo parece menor ao voltar 
A rua, a casa, até a árvore. 
Menos o sentimento. 
Esse cresce com a saudade 
Do tempo que se brincava 
Nas ruas de terra batida. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

Desejo no olhar

Fazer amor com desejo no olhar 
É abrir portais de carne 
Com a chave do espírito. 
É quando o olhar roça a pele 
Como um feitiço quente, 
Desenhando promessas em chamas 
Sem dizer uma só palavra. 
 
É o toque que ainda não veio, 
Mas já estremece. 
É a alquimia do querer, 
A magia antiga de dois corpos 
Que se reconhecem como templos — 
E se adoram como deuses. 
 
Ali, entre suspiros e segredos, 
O prazer não é só físico: 
É sagrado, é selvagem, 
É oração em gemido 
E céu desabando no lençol. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Deixar de te amar?

Mesmo que o tempo passe, 
Mesmo que o mundo gire mil vezes, 
A lembrança dos teus olhos 
Ainda me envolve — 
Doce, profunda, feroz. 
 
Fecho os olhos e lá estás: 
Não em corpo, mas em brilho, 
Não em palavras, mas em silêncio, 
Um silêncio que grita teu nome 
Nas madrugadas vazias do meu peito. 
 
Tentei esquecer-te mil vezes, 
Mas como se esquece um pôr do sol? 
Como se apaga da alma 
O que um dia foi luz? 
 
Teu olhar é porto e tempestade, 
É abrigo e vertigem, 
É a linha tênue entre sonho e saudade. 
E eu, que já quis seguir em frente, 
Me vejo parado — preso nesse instante 
Em que teus olhos cruzaram os meus. 
 
Deixar de te amar? 
Talvez um dia. 
Mas antes preciso aprender 
A viver sem tua luz 
E a aceitar a escuridão que resta. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 9 de abril de 2025

Janelas do ser

Os olhos são janelas, 
Não apenas para o mundo, 
Mas para dentro — 
De quem olha e de quem é olhado. 
 
Há quem veja paisagens, 
E há quem veja almas. 
Há quem repare o reflexo, 
E há quem atravesse o vidro, 
Para tocar o invisível. 
 
Quando um olhar encontra outro, 
E se demora, 
É o ser dizendo ao ser: 
“Eu te vejo além da superfície.” 
 
Não é só o que entra pelos olhos que importa — 
É o que sai deles. 
É a luz, o abismo, o afeto, 
O silêncio que diz: 
“Sou casa aberta para quem ousa entrar.” 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 8 de abril de 2025

O vento pode ser ameaçador

Nunca é tão real quanto parece ser 
A realidade que se apresenta 
Apenas para os olhos de alguns 
Que nem mesmo tiveram a coragem 
De abri-los para enxergar. 
 
O vento pode ser ameaçador 
Mas você não o vê chegar 
Apenas pode sentir o seu toque 
No rosto que tenta se livrar 
Quando o sonho permanece no coração. 
 
Houve um tempo no tempo 
Bem antigo que não se lembra mais 
Alguém contou um segredo blasfemo 
De algo que não pode mais acontecer 
Por causa da angústia da humanidade. 
 
Foi algo que não posso revelar 
Mas que já passou pelos seus pensamentos 
Quando estava deitado em sua cama 
E olhava para o vazio que existia 
Entre os seus olhos e o teto acima de você. 
 
E nesse momento crucial da sua vida 
Uma fronteira foi atravessada 
Uma linha muito tênue foi rompida 
E o mundo nunca mais foi o mesmo de antes 
Mesmo que você não tenha percebido isso. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 7 de abril de 2025

Podia ser uma canção de amor

 Podia ser uma canção de amor, 
Se o vento soprasse mais devagar, 
Se as palavras não fugissem da boca 
Como pássaros assustados no crepúsculo do luar. 
 
Podia ser verso, refrão e saudade, 
Feito de notas que dançam no ar, 
Um sussurro entre as batidas do peito, 
Um segredo que insiste em cantar. 
 
Podia ser uma canção de amor, 
Se teu nome rimasse com esperança, 
Se o silêncio que deixaste ao partir 
Ainda tivesse melodia para uma dança. 
 
Mas é só eco — doce, doído — 
De algo que quase foi inteiro. 
Podia ser canção... 
E foi apenas um suspiro derradeiro. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 6 de abril de 2025

Admiração

Teu olhar, um céu sem fim, 
Brilha mais que a própria aurora. 
Cada gesto diz pra mim: 
Essa beleza vive agora. 
 
Teu sorriso, luz serena, 
Inspira o mais lindo poema. 
E se o mundo perde a direção, 
Tu és a mais bela em cena. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 5 de abril de 2025

O homem feito em palavras

O homem feito em palavras 
É cada ser pulsante 
Que caminha sobre tudo o que é vivo. 
Não é carne, é verbo. 
Não respira — declama. 
Carrega no peito um dicionário de sonhos, 
E nas mãos, 
O silêncio que só a poesia sabe ouvir. 
 
Porque o verbo nasceu antes do passo, 
E o nome veio antes da face. 
O homem, este poema em carne, 
Vive entre o que sente e o que diz, 
Entre o som e o sentido. 
 
O homem feito em palavras 
Não é apenas o que diz, 
Mas o que tenta dizer e nunca alcança. 
É construção infinita — 
Um eco do que sente, 
Um reflexo imperfeito do ser. 
 
Cada ser pulsante 
Que caminha sobre tudo o que é vivo 
Carrega dentro de si uma biblioteca invisível. 
Línguas não ditas, 
Sentidos que escorrem entre os dedos da razão. 
O humano é um texto em constante reescrita, 
Feito de dúvidas, metáforas e silêncios. 
 
Viver é interpretar-se. 
Ser é traduzir o indizível. 
E enquanto caminha, 
O homem busca uma palavra que o defina — 
Mas ela nunca vem completa. 
Talvez porque a verdade do ser 
Não caiba em vocábulos, 
Mas no intervalo entre eles. 
 
Há uma essência que antecede a matéria: o verbo. 
O homem não nasce apenas do barro ou do sangue, 
Mas da palavra que o nomeia. 
Antes mesmo de saber quem é, 
Ele já foi dito por outro 
E, ao ser dito, foi moldado. 
 
O ser humano é um texto em constante revisão. 
Não é estático, nem plenamente compreendido. 
Cada indivíduo caminha como um manuscrito aberto, 
Com margens riscadas de desejos, 
Erros, e verdades provisórias. 
A linguagem não o limita — o revela em fragmentos. 
O que escapa à linguagem, porém, 
É o que mais o define. 
 
Toda tentativa de se dizer 
É também um gesto de criação. 
Falar de si é nascer de novo, 
E cada palavra usada para explicar o que se é 
É também uma tentativa de escapar do que se foi. 
 
Caminhar sobre tudo o que é vivo 
É, portanto, um ato de tradução. 
O mundo é um texto sem pontuação final, 
E o homem, esse ser pulsante, 
É leitor e autor ao mesmo tempo. 
Interpreta a si mesmo no reflexo do outro, 
E, na escuta silenciosa da vida, 
Reconhece que existe mais no não dito 
Do que no que ousa ser pronunciado. 
 
Talvez, no fim, o que somos 
Não caiba na lógica ou na gramática, 
Mas apenas no mistério poético de estar vivo: 
Um poema inacabado, 
Escrito a cada passo 
Sobre a superfície do ser. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Natureza Morta em Luz de Neon

Um ipê solitário resiste 
No meio do asfalto rachado. 
É flor que ousa nascer 
Onde só o cinza é respeitado. 
 
A noite cai com olhos vermelhos, 
Sirenes e passos apressados. 
Luzes de neon fingem beleza, 
Mas escondem becos calados. 
 
O morro vê do alto os arranha-céus 
Com janelas que brilham sem alma. 
Lá embaixo, a quebrada pulsa rimas 
De um rap que sangra e acalma. 
 
Gente vive conectada 
Mas se toca cada vez menos. 
Likes não curam feridas 
De quem acorda no veneno. 
 
Mesmo assim, a cidade respira, 
Mesmo ferida, ela grita vida. 
Nos muros, nos beats, no olhar: 
Ela é dor, é arte, é partida. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

Entre concretos e sonhos

Na calçada cinza que engole os passos, 
Corpos cruzam sem se ver, 
Olhos presos em telas, 
Corações que já esqueceram o porquê. 
 
O buzinar constante soa como sinfonia, 
Acorde de um dia igual ao da lembrança. 
No semáforo, o tempo se alterna 
Entre a pressa e a esperança. 
 
Entre prédios que tocam o céu, 
Um grafite grita cor na parede rachada, 
Voz de um artista anônimo 
Que ainda sonha acordado na madrugada. 
 
A cidade fere e acalenta, 
Cobra caro por cada suspiro de emoção. 
Mas é nela que se planta 
O desejo de voar, mesmo sem razão. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 3 de abril de 2025

A pedra de Sísifo

Caminhar em círculo 
É a arte de ir sem nunca chegar, 
De medir o tempo 
Em passos gastos sobre o mesmo chão. 
É o ensaio infinito 
De um destino que se repete, 
Onde cada curva já foi traçada 
Antes mesmo do pé tocar o solo. 
 
Os lugares são os mesmos, mas as sombras mudam, 
Como se zombassem do desejo de fuga. 
O tédio pesa nos ombros como a pedra de Sísifo, 
Rolando e rolando, sem jamais repousar. 
 
E se a vida for só isso? 
Uma coreografia exausta, 
Um relógio sem ponteiro novo, 
Um eco sem voz original? 
 
Ainda assim, seguimos. 
Porque mesmo na repetição há nuances, 
Um raio de luz 
Que dobra de forma imperceptível, 
Um silêncio que respira diferente. 
 
Talvez caminhar em círculo 
Seja apenas uma forma sutil 
De desenhar espirais 
Que ainda não aprendemos a ver. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 2 de abril de 2025

Vou insistir

Vou insistir, 
Mesmo que o vento sussurre o contrário, 
Mesmo que a sombra do medo me cerque. 
 
Vou insistir, 
Porque a mudança é brisa que refresca, 
É sol que rompe a neblina espessa. 
 
Vou insistir, 
Em cada passo, em cada olhar, 
Até encontrar o antídoto 
Para minha paranóia se dissipar. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 1 de abril de 2025

Ela é

Ela é 
Como um pôr do sol refletido no mar 
Tão bela 
Que o tempo parece prender a respiração 
Só para admirá-la. 
 
Seu riso é um poema 
Que ecoa no silêncio do mundo, 
Um verso que faz 
Até os dias mais comuns 
Parecerem extraordinários. 
 
Olhar para ela 
É como observar a lua cheia. 
Há um mistério que nunca se desfaz, 
Uma luz suave que ilumina sem ferir. 
 
Cada gesto seu 
É uma melodia que se escreve no ar, 
Um instante fugaz de beleza 
Que eu tento eternizar com os olhos. 
 
E quando ela sorri, 
O universo todo parece se reorganizar, 
Como se até as estrelas 
Buscassem formas de brilhar à sua altura. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 31 de março de 2025

Sem sentido

Essa despedida sem sentido 
É como um vento que sopra sem direção, 
Uma carta escrita sem destinatário, 
Uma vela acesa sob o sol do meio-dia. 
 
É um adeus que ecoa no vazio, 
Um nó que se desata 
Sem nunca ter sido atado, 
Um trem que parte sem jamais ter chegado. 
 
Talvez seja apenas o tempo 
Brincando de ilusão, 
Ou a vida 
Tentando nos ensinar que algumas partidas 
Não têm explicação — apenas silêncio. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 30 de março de 2025

Quando me olhas

Nos teus olhos, vejo mais do que luz— 
Vejo o céu inteiro, vejo a minha alma. 
O brilho que dança na tua íris 
Não é só reflexo, é entrega, é chama. 
 
Quando me olhas, o tempo se dobra, 
O mundo se cala, o amor se revela. 
Sou um rio que corre para teu brilho, 
Um verso perdido na tua aquarela. 
 
Se o amor tem forma, se o amor tem cor, 
Ele mora no reflexo que vem de ti. 
Pois quando me vejo nos teus olhos, 
Descubro que sempre estive ali. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sábado, 29 de março de 2025

O homem eterno

O homem eterno 
É um eco do infinito, 
Um sopro de luz 
Aprisionado no cárcere da carne. 
Sua alma, imortal e errante, 
Veste-se de tempo 
E esquece-se do seu verdadeiro nome. 
 
Cada batida do coração 
É um chamado para o alto, 
Um lamento silencioso 
Da eternidade que habita o transitório. 
 
Os ossos são grades, 
A pele é véu, 
E os olhos, ainda que janelas, 
Mal vislumbram 
A vastidão que os aguarda 
Além do horizonte do corpo. 
 
O homem eterno sonha com asas, 
Mas anda com pés de barro. 
Busca na matéria a centelha do divino 
E, ao encontrá-la, 
Percebe que ela 
Sempre ardeu dentro de si. 
 
Na despedida da carne, 
Ele se reencontra. 
O cárcere se desfaz, 
E a alma, enfim livre, 
Retorna à melodia do cosmos, 
Onde nunca deixou de estar. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

O rei amaldiçoado e o homem só

O rei amaldiçoado 
Veste sua coroa de espinhos invisíveis, 
Cada joia um peso de mil lamentos. 
O trono que ergueu com glórias passadas 
Agora é um cárcere de ouro frio, 
Onde os ecos de antigos juramentos 
Se tornam espectros a assombrá-lo. 
 
E o homem só, 
Errante entre os campos do destino, 
Caminha sob luas indiferentes. 
Sem coroa, sem trono, 
Carrega apenas o silêncio como cetro 
E a liberdade como fardo. 
Pois há prisões no poder 
E há prisões na solidão — 
Mas qual delas é a mais cruel? 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 28 de março de 2025

A chegada

Chegaste de forma singela 
Quase não a percebi 
Mas ali estava tu 
A imagem da beleza sútil 
Que dominou minha insensatez. 
 
O dia nem lembro como era 
Porque o tempo parou 
Tudo que consegui perceber 
Foi a singeleza do seu olhar 
O encanto que inebriou-me. 
 
Tudo era solidão 
Perto de mim o medo inconsciente 
A ilusão de amores perdidos 
E o amargo pesadelo 
De outra vez me apaixonar. 
 
Mas não havia nada a ser feito 
Nada que eu pudesse fazer 
Senão curvar-me diante de ti 
Deusa da minha imaginação 
O amor que sonhei a vida toda. 
 
E você chegou assim 
Quando eu menos esperava 
Você sorriu para mim 
E isso fez toda diferença na minha vida 
E preencheu o meu coração. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 26 de março de 2025

O paradoxo da urgência

Corremos, corremos, sem pausa ou porquê, 
Mas nunca nos perguntamos: corremos pra quê? 
O tempo escorrega entre dedos aflitos, 
E os dias se perdem em passos restritos. 
 
O agora sufoca, o amanhã nos consome, 
O relógio nos grita, nos cobra, e some. 
A pressa é constante, o destino é nublado, 
Um ciclo infinito, um rumo apressado. 
 
Queremos o topo, queremos o mais, 
Mas quando chegamos, queremos a paz. 
A paz que deixamos, perdida na estrada, 
Trocada por metas, e uma agenda lotada. 
 
Se o tempo é dinheiro e a pressa é um vício, 
Quem dita o preço desse sacrifício? 
Se o fim é incerto e a pressa um engano, 
Por que não sermos um pouco mais humano? 
 
Então eu te pergunto, em meio a essa corrida: 
Que tal desacelerar e sentir um pouco a vida? 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 25 de março de 2025

Entre os cacos

Num mundo que corre, sem pausa, sem freio, 
Onde a pressa devora até mesmo o anseio, 
Ousar perguntar é quase um perigo, 
Um ato rebelde, um salto ao abismo. 
 
O ruído se ergue em muralha espessa, 
Atropela verdades, dilui a promessa. 
Mas quando o eco se faz insuportável, 
O silêncio se ergue, firme, incontestável. 
 
E quando as certezas caem por terra, 
Feito vidro partido no chão da espera, 
O pensamento, descalço, caminha entre os cacos, 
Tateando o novo em meio aos destroços. 
 
Pois só quem se perde entre mil incertezas 
Descobre que a dúvida é sua fortaleza. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

domingo, 23 de março de 2025

Justiça

 A justiça veste um véu que o vento descobre, 
Mas seus olhos, cegos, ainda hesitam. 
Vem a cavalo, dizem, mas tropeça em pedras 
Que a injustiça semeia pelo caminho. 
 
Nos tribunais, a balança inclina-se, 
Não pelo peso da verdade, 
Mas pelo ouro que lhe é posto na mão. 
As palavras da lei são frias, 
Mas o que buscamos é fogo,
Justiça que arde, que pulsa, que vive. 
 
Anoitece, e as sombras sussurram 
O que ninguém ousa explicar. 
Não há justiça na casa da justiça, 
Pois ali, a verdade é só um eco distante, 
Perdido entre os corredores do poder. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

Simplicidade

A flor desabrocha sem perguntas, 
O rio corre sem dúvida, 
Mas nós — ah, nós — 
Carregamos o peso do porquê 
E esquecemos de apenas ser. 
 
Talvez a simplicidade 
Seja aceitar o instante, 
Permitir-se fluir, 
Como a brisa que não teme o amanhã. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

O paradoxo da existência

Há uma voz que ecoa no silêncio, 
Grita nas sombras, mas ninguém a escuta. 
É o canto da verdade amarga, 
O lamento dos invisíveis, 
O verbo esquecido antes de ser dito. 
 
O poeta vê o tempo ao contrário, 
Sente o amanhã como quem lê as veias do vento. 
Cada palavra escrita é um destino moldado, 
E no caos da metáfora, 
Um mundo nasce antes de existir. 
 
O fim não tem pressa, 
Não se dobra aos caprichos da vontade. 
Mesmo quando enterramos as memórias, 
Elas florescem sob a terra, 
Teimando em ser eternas. 
 
O vento sopra e sopra outra vez, 
Como um sonho inalado pelo divino. 
Seus dedos invisíveis tocam a pele do mundo, 
Viciados em movimento, 
Inebriados pela dança do eterno. 
 
A simplicidade de existir é um paradoxo: 
Tão leve quanto o vento que dança, 
Tão densa quanto o silêncio que pesa. 
Ser é um ato tão natural quanto respirar, 
Mas a consciência nos enreda em labirintos 
Onde buscamos significados 
Para aquilo que já é inteiro. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense

sexta-feira, 21 de março de 2025

A chaga oculta

No silêncio das sombras frias, 
Tece-se o fio da traição. 
Mãos que juraram justiça, 
Vendem-se ao ouro da ilusão. 
 
Sonhos se tornam ruínas, 
Honra se perde no mar, 
Onde moedas afundam consciências, 
E a verdade deixa de brilhar. 
 
Cada pacto selado no escuro 
Rouba o pão de quem tem fome. 
Cada mentira bem dita 
Apaga histórias, apaga nomes. 
 
Mas o tempo, senhor do destino, 
Sabe pesar cada ação. 
A justiça pode ser lenta, 
Mas sempre encontra a razão. 
 
E quando as máscaras caírem, 
E o véu da farsa ruir, 
O que restará dos corruptos, 
Senão o eterno exílio do porvir? 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 20 de março de 2025

O que é poesia?

Poesia é vento que dança no ar, 
É onda que vem sem avisar, 
É riso e lágrima, luz e luar, 
É tudo e nada num só respirar. 
 
É voz do silêncio, som do sentir, 
É chama que arde sem se exibir, 
É traço invisível, eterno a insistir, 
É o mundo inteiro num breve existir. 
 
É pássaro livre, é sonho acordado, 
É tempo suspenso num verso bordado, 
É rima que embala, é dor que conforta, 
É porta entreaberta para outra porta. 
 
Poesia é vida que pulsa no peito, 
É alma despida, sem medo, sem jeito, 
É arte, mistério, encanto e magia... 
A poesia? Ah... a poesia! 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

quarta-feira, 19 de março de 2025

É veneno o teu encanto

 Teu olhar, centelha ardente, 
Queima a alma, prende a mente, 
Num feitiço tão sutil, 
Que vicia, é doce, é vil. 
 
Teu toque, brisa envenenada, 
Suave, leve, enlaçada, 
Entre beijos e meu egoísmo, 
Deixo-me cair no abismo. 
 
E se é veneno o teu encanto, 
Bebo a taça sem espanto, 
Pois morrer de amor assim, 
É um destino bom pra mim. 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense

terça-feira, 18 de março de 2025

Últimas palavras de amor

As últimas palavras deste amor 
E você vai ter que ouvir. 
Não são súplicas, nem promessas, 
Nem mesmo versos tentando te iludir. 
 
São restos de tudo que um dia fomos, 
O infinito eco do que já sonhamos, 
Nas noites em claro, os sonhos 
De tudo que não realizamos. 
 
Você vai ter que ouvir 
O silêncio gritando entre nós, 
As memórias que dançam no escuro, 
O peso do adeus em minha voz. 
 
Não vou pedir que volte, 
Nem fingir que ainda há solução. 
Mas antes de tudo acabar, 
Deixa-me dar o meu perdão. 
 
Pois mesmo que o tempo não apague, 
Mesmo que o vento sopre e termine a dor, 
As últimas palavras do coração 
Serão sempre: "Vá em paz, meu amor!" 
 
Poema: Odair José, Poeta Cacerense