Quem sabe um dia a história falará por mim
Dir-se-á o quanto sofri
Que nem sei explicar como não morri
Nos frios porões destes navios
Que transportaram-me para longe de minha terra
E tiraram a minha liberdade.
Vendido como escravo
Para trabalhar a terra estranha
Nos canaviais,
Nas lavouras de algodão,
Nas minas de ouro
O meu couro é surrado
E sou maltratado o tempo todo.
O chicote nunca teve descanso
Enquanto minhas costas estavam em pedaços
Os gritos nunca foram ouvidos
Nem os gemidos atendidos
E não se sabe como sobrevivi nos porões
Mas, antes não tivesse visto as florestas
Nem pisado meus pés nas areias da praia.
Nunca pararam para pensar que sou humano
Que sinto dor
Que tenho uma alma e que penso
Nunca deixaram-me ser livre
Para cultuar os meus deuses
Mas me impuseram os seus que pregavam a misericórdia
Quando o chicote era erguido até os céus
Antes de descer fortemente em minhas costas.
A dor é maior ainda
Ao ouvir que não precisa reparação
O olhar preconceituoso sobre os meus descendentes
A exclusão social
Que empurra o negro para longe
Porque a sua pele é diferente
Dessa gente
Que só pensa em si mesma.
Nos porões eu sofri a violência física
Nas ruas meus irmãos sofre
Violência psicológica
Violência física
Violência discriminatória
Violência de todas as formas
Como se ainda estivéssemos dentro dos porões!
Basta de racismo!
Chega de discriminação!
Basta de intolerância!
Deixem-nos sairmos dos porões da escravidão!
Poema: Odair José, Poeta Cacerense
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