quinta-feira, 10 de julho de 2025

Monólogo da Senhora dos Vocábulos Altivos

 Ah, mundo irrequieto e despojado de nobreza, 
Por que trocastes o cetro das palavras 
Pelo grunhido da pressa e o murmúrio da vulgaridade? 
 
Outrora, a linguagem era tapete estendido 
Para o pensamento passar em glória. 
Cada vocábulo, uma relíquia; 
Cada frase, um relicário. 
 
Lembro-me do tempo em que até os silêncios tinham títulos, 
E os adjetivos curvavam-se antes de servir ao substantivo. 
Hoje, corre-se ao dizer, tropeça-se no falar, 
E se arranca do verbo o véu da reverência. 
 
Mas eu persisto. 
Ergo minha voz como quem acende um candelabro 
Em meio a uma noite de neologismos selvagens. 
Pois ainda creio que há beleza no elevado, 
Que há dignidade na escolha precisa, 
E que o pensamento merece ser vestido 
Com mais que trapos ocasionais. 
 
Sim, chamem-me arcaica, anacrônica ou altiva
Aceito todos esses títulos como medalhas. 
Pois onde o mundo vê excesso, vejo forma. 
Onde vê rebuscamento, vejo escultura. 
 
E quando tudo ruir, 
 Serei a última a pronunciar com voz firme: 
 'Ainda resta linguagem'. 
 
 Poema: Odair José, Poeta Cacerense 
 
Obs. Dizem que ela habita bibliotecas esquecidas e corredores onde o silêncio respira com reverência. Veste-se com tecidos antigos e leva um caderno de couro onde escreve, com pena e tinta, as palavras que julga dignas de permanecer. Seus olhos veem o mundo como um palácio em ruínas, mas sua língua, ainda assim, insiste em tratá-lo como realeza.

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